A Ciacon Construções e Obras, que tem entre os sócios um “laranja”, o aposentado e semianalfabeto Luiz Carlos Vareiro, 61 anos, recebeu R$ 895,5 mil em 2012 da Prefeitura de Campo Grande por uma obra incompleta, malfeita e com a utilização de material de baixa qualidade. O caso foi denunciado à Justiça no início de novembro deste ano pelos promotores Adriano Lobo Viana de Resende e Plínio Alessi Júnior.
Em 18 de setembro de 2012, no apagar das luzes da gestão de Nelsinho Trad (PTB), o município contratou a construtora para realizar a reforma e ampliação do CEDOC (Centro de Documentação e Almoxarifado Central). Dois meses depois, houve aditivo para elevar o valor da obra em R$ 161.772,91.
A denúncia foi feita pelo ex-secretário municipal de Administração, Ricardo Ballock, da equipe de Alcides Bernal (PP). Em defesa apresentada à promotoria, Nelsinho informou que a obra já tinha sido investigado pelo Ministério Público Estadual, que concluiu o inquérito sem apontar irregularidade.
Perícia realizada pelo MPE (Ministério Público Estadual) constatou que 80,7% da ora foi executada e uma série de problemas. A laje cedeu logo após a mudança dos funcionários para o novo espaço, o que exigiu reforço na estrutura para evitar desabamento. O escoramento foi feito pela Ciacon.
O projeto previa área construída de 192,85 metros quadrados, mas foram feitos apenas 119,86 m². A empresa deixou de construir dois banheiros previstos na ordem de serviço.
A pintura prevista era de uma área de 2.698,9 m², mas só houve a execução em uma extensão de 2.273,14 m². A calçada externa rachou. O portão de elevação colocado era maior do que o determinado no projeto.
Apesar das inúmeras irregularidades, da obra não ter sido concluída e a utilização de material de qualidade inferior, os fiscais da prefeitura na época, o arquiteto Nasser Gazal Mohamed e o engenheiro civil Múcio José Ramos Teixeira, realizaram três medições consecutivas em 16 de outubro, 9 de novembro e 21 de dezembro de 2012 para atestar a execução do serviço e liberar o pagamento para a empreiteira.
Além deles, o ex-secretário municipal de Infraestrutura, João Antônio De Marco, foi denunciado pelas irregularidades.
Vareiro, que confessou em depoimento à polícia ser “laranja”, e os sócios Reginaldo João Bacha, e Kelly Santos Assunção, foram denunciados por improbidade administrativa.
Os promotores pediram a condenação do grupo por improbidade administrativa, a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos, o ressarcimento integral do prejuízo de R$ 895,5mil e o pagamento de multa civil de R$ 1,791 milhão pelos prejuízos causados.
“No que tange ao tipo previsto no artigo 11 da Lei n. 8.429/92, restou configurado que, DELIBERADA e DOLOSAMENTE, agiram de forma DESONESTA e DESLEAL com a Administração Pública, bem como violando flagrantemente a legalidade”, frisam Adriano e Plínio.
“Destarte, é evidente que o descumprimento DOLOSO de seus deveres, RESULTANDO EM UMA OBRA INACABADA, DE PÉSSIMA QUALIDADE, que certamente não atende ao interesse público municipal”, concluem, sobre a qualidade do almoxarifado central e do CEDOC.
Os fatos foram tão evidentes, que dois juízes concederam liminar bloqueando os bens dos empresários, dos servidores municipais e do ex-secretário municipal de Infraestrutura.
O primeiro a determinar o bloqueio de R$ 895,5 mil foi o juiz David de Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, Indno dia 1º de novembro deste ano. Ele optou pela indisponibilidade antes da notificação para a apresentação da defesa porque, conforme relatou, dificilmente é encontrado dinheiro nas contas dos acusados após o pedido para apresentar a defesa prévia.
Por um erro na distribuição do Poder Judiciário, a mesma ação foi distribuída para o juiz Alexandre Antunes da Silva, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, que também deferiu o pedido de indisponibilidade dos bens no valor do dano causado ao patrimônio público, de R$ 895,5 mil.
A Ciacon e os seus sócios já estão com os bens bloqueados desde abril, em outra ação do MPE. Eles integram o grupo denunciado junto com o ex-secretário municipal de Planejamento e procurador jurídico da Câmara, André Scaff, por enriquecimento ilícito e pagamento de propinas. A indisponibilidade neste ação, no valor de R$ 14milhões, foi decretada em abril deste ano.
Promotor só falará sobre investigação do roubo da propina ao final da investigação
O promotor Marcos Alex Vera de Oliveira, do Grupo Especial de Combate à Corrupção, informou que só deverá falar após concluir a investigação sobre o suposto roubo da propina de R$ 270 mil destinada ao corretor de gado, José Ricardo Guitti, o Polaco.
A quadrilha foi presa no dia 6 de dezembro pela Tropa de Choque. Aos policiais, Luiz Carlos Vareiro, conhecido com oVéio, contou que era “laranja” da Ciacon e realizou o assalto a pedido de Rodrigo Azambuja, filho do governador Reinaldo Azambuja (PSDB).
Ele teria sido contratado para pegar a propina, que seria levada a Polaco pelo comerciante Ademir José Catafesta, 62. O suposto roubo ocorreu na BR-262, perto da Vila Jamic, no dia 27 de novembro. No boletim de ocorrência, registrado quase 24 horas depois, a vítima disse que os bandidos levaram o carro e R$ 9 mil em dinheiro.
Ao prender a quadrilha, a história ganhou outra dimensão. Os bandidos acusaram o filho do governador e o caso passou a ser investigado pelo MPE.
O Governo do Estado informou que também pretende esclarecer a história, que classificou como “estranha”. Por meio da assessoria, Rodrigo e Reinaldo negaram qualquer participação no episódio.