Portugal é um dos países mais afetados pela crise econômica na Europa, com a inflação saindo de 1,3% para 7,8% em um ano, conforme dados do Instituto Pordata. Somada à disparada dos preços dos alimentos e serviços, o país ainda vive uma acentuada crise no mercado imobiliário, com redução da oferta de imóveis e aumento nos valores dos aluguéis. Como forma de mudar o cenário, o governo decidiu intervir no mercado imobiliário, socorrer inquilinos e ajudar a pagar os juros das hipotecas.
A aplicação das medidas do governo socialista começou em março, mas são retroativas a janeiro de 2023, e incluem dez eixos que totalizam 900 milhões de euros (R$ 5 bilhões). Com os recursos, o governo mira em aumentar a oferta no mercado, convertendo áreas de comércio em residenciais; simplificar os processos de licenciamento na construção; comprar casas para a aplicação de aluguéis sociais; combater a especulação e proteger as famílias da elevação dos juros e do valor dos contratos de arrendamento.
Turismo será um dos principais setores afetados pelas novas medidas
Entre as medidas mais agressivas anunciadas pelo primeiro-ministro António Costa está a limitação de novas emissões de licenças dos chamados alojamentos locais, que disponibilizam imóveis para o turismo. Também serão reavaliadas as licenças atuais de maneira permanente, até 2030. Hoje, o turismo representa 19% do PIB (Produto Interno Bruto) português, gerando empregos, renda, mas também cerceando o mercado imobiliário, já que ficou mais vantajoso o aluguel temporário em detrimento do permanente.
Com a grande parcela dos imóveis disponíveis para o turismo, o arrendamento local sofreu inédita valorização, com os aluguéis saltando 42,1% em 10 anos, conforme dados do INE (Instituto Nacional de Estatísticas). Em entrevista coletiva, António Costa afirmou que a medida visa impor “forte incentivo para que regressem ao mercado de habitação fracções habitacionais que estão dedicadas ao alojamento local”.
O governo tenta, ainda, minimizar a precarização das moradias, especialmente nas regiões metropolitanas de Lisboa e do Porto, onde um apartamento com um quarto pode superar com facilidade 600 euros e um quarto 400. Como forma de ajudar no pagamento dos aluguéis, o governo decidiu disponibilizar até 200 euros por família no período máximo de 5 anos.
Campo-grandense afirma que medida é alívio diante das elevadas despesas
A possibilidade de ajuda soou como alívio para a advogada campo-grandense Roseli Aparecida Ramos, 50 anos, que mora em Peniche com as filhas de 13 e 8 e paga quase 500 euros de aluguel. “Vai ajudar muito. Eu pago, ainda, 100 euros de energia e 80 de água, tendo que cuidar sozinha das meninas e não está fácil”. Roseli colocou as crianças na escola pública, mas precisa pagar o lanche das crianças e os materiais, já que não conta com nenhum apoio do governo.
A situação da advogada é partilhada por cerca de 300 mil famílias, conforme a previsão do governo português. Essa parcela da população recebe pouco mais que o salário mínimo de 760 euros (R$ 4.283,51) e, às vezes, nem isso, considerando que a taxa de desemprego local é de 6,5%.
Bancos também terão que contribuir com o freio na inflação do setor imobiliário português
Outro setor chamado a contribuir com respostas à crise imobiliária é o bancário. A partir de agora, os bancos terão que oferecer taxas fixas nos empréstimos habitacionais. Por parte do governo serão destinados apoios para o pagamento de juros, totalizando 700 euros por ano. Em dois anos, os juros desse tipo de financiamento aumentaram em 88,5%, segundo dados do Banco Central Europeu.
A bonificação ainda gera dúvidas, como é o caso da gerente de marketing Cláudia Guerreiro, que já teve resposta negativa para ser incluída na medida. “Fui ao banco, onde explicaram que é preciso ter mais de um ano de contrato com a entidade. A medida não aponta isso, vou pesquisar com mais cuidado. Está muito difícil viver com essa pressão inflacionária e ganhando pouco mais que o salário mínimo”.