O desembargador Rogério Fraveto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, concedeu tutela de urgência para suspender a transferência da Eldorado Brasil Celulose para a Paper Excellence, multinacional fundada pelo indonésio Jackson Wijaya. O magistrado acatou pedido feito em ação popular que apontou risco para a soberania nacional.
Pela legislação brasileira, estrangeiros não podem comprar terras sem aval do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e do Congresso Nacional. De acordo com o autor da ação, Luciano José Buligon, a Eldorado conta com 249 mil hectares de terras para o cultivo de eucalipto.
Veja mais:
Turma derruba decisão da presidente do STJ e manda Eldorado pagar R$ 500 milhões a MS
STJ suspende decisão polêmica do TJ que livra Eldorado de pagar meio bilhão em ICMS
JBS pagou R$ 10 milhões a delator por “ajuda” em retirar sócio da Eldorado
A liminar causa uma reviravolta na disputa pelo comando da Eldorado, em Três Lagoas, já que a Paper havia ganho na Câmara de Arbitragem e no Tribunal de Justiça de São Paulo. A decisão de Fraveto põe um novo personagem na história e mantém a empresa sob o comando da J & F, controlada pelos irmãos Joesley e Wesley Batista Mendonça.
Inicialmente, a ação foi protocolada em Chapecó (SC). No entanto, a juíza substituta, da 2ª Var Federal da cidade, extinguiu a ação por inadequação da via eleita e impossibilidade jurídica dos pedidos. Ela concluiu que a ação popular não era o meio processual adequado para a defesa da soberania nacional, por se tratar de fundamento do Estado Democrático de Direito, e não patrimônio da União.
“Alega o requerente que a soberania nacional trata-se de bem que pode ser tutelado pela via da ação popular. Afirma que a Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU) reconheceu a soberania nacional como patrimônio imaterial, conforme constante no Plano Nacional de Caracterização, que definiu as metas para o período de 2021 a 2025”, pontuou o desembargador.
“Afirma que a empresa ré Paper Excellence anunciou a aquisição da ré Eldorado Brasil Celulose S/A, proprietária de 249 mil hectares de florestas de eucalipto plantadas em áreas rurais brasileiras e que ambas empresas objetivam a aquisição de terras na região oeste de Santa Catarina para plantio de eucalipto e extração de madeira para exportação, e que tais aquisições, se realizadas sem a observância dos requisitos legais, podem inviabilizar a continuidade das atividades econômicas na região”, destacou.
“Especificamente em relação a atuação da ré Paper Excellence BV, afirma que a empresa adota estratégia maliciosa para burlar as exigências para aquisição de terras rurais por estrangeiros, iniciando pela aquisição de menos de 50% do capital de empresas nacionais proprietárias de vastas áreas rurais, fomentando a aquisição de mais áreas de terras rurais e, em seguida, adquire a integralidade do capital mediante a celebração de contratos confidenciais”, relatou.
“A soberania nacional insere-se entre os bens imateriais protegidos em favor do Estado Brasileiro. A condição da soberania ser o primeiro princípio fundamental da República Federativa do Brasil, segundo dispõe o art. 1º da Constituição Federal, reforça sua necessidade de valoração como fundamento de proteção do Estado Democrático de Direito, passível de controle e aferição pelo instituto da Ação Popular, como no caso em tela”, avaliou o desembargador federal.
“As provas constantes dos autos acima referidas não deixam dúvida quanto à intenção de aquisição pela ré Paper Excellence, pessoa jurídica estrangeira, da totalidade das ações da ré Eldorado Brasil Celulose, proprietária de terras rurais, cuja aquisição por pessoa jurídica estrangeira deve observar os requisitos legais previstos no art. 1º, § 1º e 8º, da Lei n.º 5.709/71. Tais requisitos não apenas protegem a soberania nacional, mas também buscam evitar investimentos meramente especulativos, aumento da desigualdade social e preservar a função social da propriedade”, esclareceu.
“A urgência da medida requerida pelo autor popular se verifica pela prova inequívoca do negócio que está sendo realizado entre as empresas rés, bem como pelas notícias divulgadas pela própria ré Paper Excellence dando conta da intenção de adquirir outras áreas rurais além das pertencentes à ré Eldorado Brasil Celulose, sem a observância dos requisitos previstos nas Leis n.º 5.709/71 e 8.629/93”, concluiu.
“De acordo com o colegiado, a PE deve apresentar a comprovação de que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Congresso Nacional tenham dado autorizado a aquisição da Eldorado antes da assinatura do contrato em 2017”, afirmou.
“Na decisão consta que até que todas as aprovações necessárias sejam apresentadas, a transferência da Eldorado para a C.A. Investment (representante da Paper Excellence no Brasil) ficará suspensa. Com isso, a J&F Investimentos segue como controladora da fabricante de celulose”, concluiu Rogério Fraveto.
“Segundo a lei que regula a compra e posse de terras e imóveis rurais no Brasil por estrangeiros, pessoas jurídicas estrangeiras só poderão adquirir imóveis rurais destinados a implantar projetos agrícolas, pecuários, industriais ou de colonização depois de aprovados pelo órgão federal competente”, alertou.
“Por considerar que a PE não apresentou nenhuma dessas aprovações, a venda da empresa da J&F para os indonésios foi impedida, já que a Eldorado possui mais de 250 mil hectares de terras com plantações de eucaliptos”, justificou-se.
O litígio entre as partes continua e guerra bilionária deve ter novos capítulos. O principal impacto será o atraso no investimento em uma nova linha de produção, que terá investimento de R$ 16 bilhões e vai gerar 2,6 mil empregos diretos.