Mário Pinheiro, de Paris – Não importa o tamanho da complicação, ou infecção intestinal, como consequência de cirurgia de várias horas, se é que os médicos não estejam mentindo. Quando o juramento de Hipócrates feito pelos médicos ganha voz na política, se esquece a ética e mentir não é tão grave, sendo que hoje há médicos vilões que até estupram paciente em coma ou sedado.
Se enfiar numa UTI é coisa grave quando a saúde está realmente com um pé na cova. Ora, pelo que se nota pela live, entrevista para televisão, risos, piadas, recepção de políticos, a equipe de televisão, o andar teatral pelo corredor com direito a demonstração do sofrimento inexistente, é pecar contra quem está morrendo por falta de medicação ou por vaga na unidade de terapia intensiva.
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O absurdo sempre vai acompanhar os fatos. Se olharmos pelo retrovisor, veremos que o discurso messiânico ganhava proporção na cabeça de infelizes. Estes infelizes não captaram tamanha astúcia do político que mal sabia falar, mas precisava de um fato novo pra ser enviado ao hospital.
O resto o povo conhece. Deu certo, a vitimização do coitado diante de uma equipe médica que sequer tinhas luvas de cirurgião na fotografia. O agressor não foi agredido, o trataram com humanidade, foi enviado a uma penitenciária de segurança máxima, considerado desequilibrado mental, mas sem provas, proibido de se comunicar, mas sem nenhum tostão furado no bolso para pagar os três advogados.
Segundo pessoas próximas de Bolsonaro, ele teria descoberto um tumor benigno no intestino grosso e precisaria de uma intervenção. A crise política de credibilidade jogou a seu favor porque Lula estava preso e enfrentando as suposições e convicções de Dallagnol e Moro. Pronto, estava eleito sem proclamar nenhum discurso e sem anunciar o principal, o programa de campanha e de governo. É o absurdo que se torna realidade.
Na obra em que Albert Camus trata deste assunto é sobre a condenação de Sísifo. Nenhuma comparação aqui é possível. Porque para Camus o absurdo está na condenação, na pena a ser cumprida. O caso do ex-presidente brasileiro encontra-se mesclado de medo, sem tempo de gozar e gastar “tudo que ganhou com seu trabalho honestíssimo”.
Sisifo deveria rolar aquela pedra redonda do pé da montanha ao seu cume. É simplesmente impossível. No Brasil, pelo STF, o moço está inelegível e se tornou réu e nem recebeu condenação. Não há pedra pra quebrar, nem para rolar no cume da Papuda.
Em Camus, ao tratar de Sísifo, o caso faz parte da mitologia grega. Nele a existência é dolorosa, não há esperança e chega-se a falar do suicídio como recurso. Ele resume quase tudo no mal do espírito que é um assunto de Sören Kierkegaard, Martin Heidegger e Karl Jaspers. São absurdos da atualidade ocupar um quarto de UTI sem a explícita necessidade.
Ao assinar a intimação judicial, a pressão arterial subiu, a voz ficou possante, o problema gástrico diminuiu e já não havia necessidade da sonda por cima do nariz. O processo começa a correr no STF, há prazos a serem obedecidos, não há como correr. A escapatória seria a fuga.