O juiz Ariovaldo Ariovaldo Nantes Corrêa julgou improcedente mais uma ação popular que denunciou o desvio de combustível de viaturas da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul no início dos anos 2000. O magistrado decidiu que não houve crime nem dano aos cofres públicos na utilização de cartões genéricos, também chamados de “cartão coringa”, no abastecimento de veículos.
A denúncia sobre dano ao erário foi ajuizada em 2007 pelo advogado e delegado aposentado Paulo Magalhães Araújo, que viria a ser executado em junho de 2013, quando esperava pela filha sair da escola no Jardim dos Estados, em Campo Grande. Além dele, um réu também faleceu no decorrer da ação, o também delegado aposentado Milton Watanabe Tocikazu. Ele teve um ataque cardíaco durante uma caminhada no Parque das Nações Indígenas, em março de 2023, aos 72 anos.
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Com a morte do ator da ação, o Ministério Público Estadual assumiu a representação popular que pedia a anulação de atos de abastecimento de combustível em viaturas realizados com os cartões “genéricos/coringas”, entre os meses de fevereiro a agosto do ano de 2002, pela Polícia Civil, e a condenação dos réus a restituírem aos cofres públicos o montante equivalente ao combustível despendido irregularmente cujos atos sejam nulos ou anulados, no total de R$ 84 mil.
Em 2021, o Governo do Estado e a empresa Taurus Distribuidora de Petróleo assinaram um contrato para fornecimento de combustíveis aos veículos oficiais em postos credenciados por meio do uso cartão inteligente de abastecimento, o smart card, e também foram emitidos cartões de abastecimento genéricos, os “coringas”, para a Polícia Civil.
Havia a previsão da possibilidade de utilização do cartão coringa para abastecimento de motores “estacionários” e demais equipamentos cuja locomoção até o posto credenciado não fosse possível.
A acusação apontou o uso repetido por diversas vezes, ao longo do ano de 2002, do mesmo cartão coringa, no mesmo dia e em horários muito próximos, com poucos minutos de diferença entre um abastecimento e outro, sendo que tal situação também foi demonstrada em perícia realizada.
O então delegado Milton Watanabe Tocikazu exercia a função de diretor-geral da Polícia Civil e deveria fiscalizar a utilização dos cartões de forma como estipulada no contrato. Luiz Tadeu Gomes da Silva atuava como diretor-adjunto, sendo que a gestão da frota era responsabilidade de Miriam Elizabeth Lemos Dutra. No período de fevereiro a agosto de 2022, foi realizado o abastecimento de 46.652,53 litros de combustível – entre gasolina, álcool, óleo diesel -, totalizando o valor de R$ 84.040,08.
“Ocorre que a prova colhida não permite concluir que houve o efetivo desvio do combustível por meio da utilização dos cartões genéricos como indicado na inicial”, decidiu o titular da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande.
“Com efeito, o próprio requerente originário, em emenda à inicial, reconheceu que os cartões genéricos eram utilizados para o abastecimento de veículos oficiais/viaturas novos ou apreendidos e colocados à serviço da administração pública até a chegada dos respectivos cartões de abastecimento, bem como para possibilitar a realização de viagens oficiais interestaduais, ou seja, eram utilizados em prol da própria administração pública com amparo em interpretação do item 4.9 do projeto base do contrato n.º 18/2001-SEGES, o que é incontroverso nos autos e justifica a sucessividade de alguns abastecimentos realizados pelo mesmo servidor, na mesma data e com o mesmo cartão smart card”, fundamentou Ariovaldo Nantes Corrêa.
“Em outras palavras, a utilização dos “cartões coringa” destinados ao abastecimento de viaturas, da forma como consta nos autos, foi realizada com amparo em interpretação de cláusula contratual para o caso de veículos oficiais em viagens interestaduais, novos ou apreendidos e colocados à disposição da administração pública até a chegada do respectivo cartão de abastecimento, o que não se confunde com desvio de sua finalidade, ilegalidade ou irregularidade exigidas para a anulação do ato administrativo”, relatou.
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa considerou não ter ficado comprovado a prática de ato “lesivo ou potencialmente lesivo” pelos réus, pois a medida adotada por Milton Watanabe Tocikazu, Luiz Tadeu Gomes da Silva e Miriam Elizabeth Lemos Dutra teve como finalidade o atendimento da própria necessidade da administração pública.
Isso porque que a prática narrada na denúncia “teve amparo em interpretação de cláusula contratual e não tem o condão de macular o patrimônio material, moral, cultural ou histórico do Estado, tendo em conta que os requeridos fizeram na época o que aparentava ser o melhor e mais útil ao interesse público apresentado”.
A sentença com a absolvição dos acusados foi publicada no Diário Oficial de Justiça de segunda-feira, 5 de maio.