O Tribunal Regional Eleitoral retoma, nesta terça-feira (27), o pedido para cassar os mandatos da prefeita Adriane Lopes (PP) e da vice-prefeita, Camilla Nascimento de Oliveira (Avante) por compra de votos. “A interferência ilícita foi tamanha que subverteu o resultado natural das urnas. Cassar esse mandato não é afrontar a democracia, é restaurá-la”, defendem os advogados Newley Amarilla, Silmara Araújo Amarilla e José Eduardo Rangel de Alkmin.
O julgamento histórico, porque vai se decidir entre o respeito à vontade popular ou ao poder econômico, deve ser retomado com o voto do juiz eleitoral Márcio de Ávila Martins Filho, que pediu vistas. Além dele, o futuro da democracia estará nas mãos dos desembargadores Carlos Eduardo Contar e Sérgio Fernandes Martins, do juiz Vitor Luís Guibo de Oliveira, do juiz federal Fernando Nardon Nielsen e do juiz eleitoral Carlos Alberto Almeida de Oliveira Filho.
Veja mais:
Cassação de Adriane é punição a prática repugnante e lição contra voto de cabresto, diz vereador
Após prometer em plenário, juiz não divulga relatório sobre pedido de cassação de Adriane
Relator reconhece compra de votos, mas vota contra cassação de Adriane Lopes e Camilla
Um dos pontos controvertidos apontado pelo relator, juiz Alexandre Antunes da Silva, é de que a cassação poderá causar instabilidade em Campo Grande, já prejudicada pela cassação de Alcides Bernal (PP). Só que ele foi vítima de golpe político, conforme denúncia do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado).
“Neste contexto, sustentar que a atuação da Justiça Eleitoral causaria instabilidade administrativa à Capital é inverter a ordem constitucional: não se protege a estabilidade administrativa ao custo da erosão da democracia”, rebateram os advogados.
“Até porque a consequência prática dessa cassação será a designação de novas eleições”, frisam. Nesta linha, as beneficiadas pelo suposto crime, a compra de votos, conforme vídeos, depoimentos e pagamentos via PIX, podem ser punidas. A defesa da prefeita alega que não há prova de que ela tinha conhecimento da compra de votos, apesar de ter sido beneficiada.
Em xeque, o papel da Justiça Eleitoral
“Infere-se, a partir dos precedentes acima colacionados, que a preocupação da Justiça Eleitoral é proteger a lisura do processo democrático, adotando postura rigorosa diante de veementes indícios de captação ilícita de sufrágio. Ao revés da tese defensiva (e na contramão do voto do eminente relator), a configuração do ilícito não exige prova robusta, firme ou inabalável da anuência do candidato, tampouco sua participação direta – bastando a existência de indícios, fatos públicos e notórios ou o vínculo com os responsáveis pela prática ilícita”, pontuam os defensores.
“O argumento apresentado pelo relator em seu voto — qual seja, o de que a cassação representaria afronta à decisão soberana do eleitor — inverte a lógica da democracia e ignora o cerne da controvérsia: soberania popular foi corrompida pela compra de votos, prática que distorceu a manifestação legítima da vontade coletiva”, rebatem.
“O que se presencia, portanto, não é a punição da vontade do povo, mas a reparação de um processo viciado, em que as candidatas que desrespeitaram as regras saíram vitoriosas, em detrimento daqueles que disputaram de forma lícita”, apelam os advogados.
“A resposta ao abuso de poder não pode ser a leniência, sob pena de se institucionalizar a impunidade como regra. A Justiça Eleitoral não deve tolerar o sequestro da vontade popular em nome de um pretenso ‘pragmatismo’, mas sim afirmar que a lisura do processo eleitoral é condição inegociável para qualquer mandato legítimo. Aqui, há gravidade, há potencialidade e — sobretudo — há prova. A cassação é não apenas jurídica e juridicamente possível. É moralmente necessária”, defendem.
Prova cabal vira dilema
O juiz Alexandre Antunes da Silva manteve a linha da sentença, de que houve compra de votos, mas não houve “prova cabal” de que a prática teve o aval ou anuência de Adriane Lopes. Apesar da assessora ser lotada no gabinete, não houve prova de que a prefeita ordenou a compra de votos.
“A presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral versa, dentre vários graves temas, sobre a comprovação de um esquema de captação ilícita de sufrágio em favor da candidatura das recorridas, cuja existência foi reconhecida pelo juízo de origem. Divergência remanescente restringe-se à participação – direta ou indireta – das investigadas no ilícito eleitoral. A sentença recorrida, embora reconheça o fato, refutou-o sob argumento de ausência de prova cabal quanto à ciência ou anuência das candidatas”, pontuaram os advogados do PDT e do Democracia Cristã.
“A tentativa de dissociar a prática comprovada de compra de votos da candidatura de Adriane Lopes não resiste ao exame da realidade processual. As provas demonstram que a operação de compra de votos foi executada por uma rede de agentes diretamente vinculados à estrutura política e administrativa da própria candidata Adriane Lopes, conforme ilustra o esquema funcional desvelado pelas testemunhas e representado graficamente nestes memoriais: Simone, Rodrigo Hata, Dr. Marcos, Dinho e Darci não são personagens periféricos ou alheios à campanha, mas figuras centrais”, frisaram.
“Ignorar a cadeia de comando e as conexões diretas entre os autores da compra de votos e a candidata é premiar o dolo oculto com o verniz da omissão. A prova não exige a gravação de Adriane entregando dinheiro ou prometendo vantagem — exige, sim, coerência lógica entre os fatos, os vínculos e os resultados eleitorais obtidos a partir da ilicitude cometida por sua equipe. A existência desses fortes e incontestes elementos de prova foi reconhecida no judicioso parecer ministerial, que opinou pelo provimento do recurso e procedência da AIJE”, concluíram.
O julgamento será histórico, mesmo que não casse a prefeita. Os sete juízes vão entrar para a história de Campo Grande. Hoje, eles vão decidir, de que lado da história estarão?