Ex-diretor-presidente da Funtrab (Fundação Estadual do Trabalho), Wilton Melo Acosta se manifestou na ação de improbidade administrativa em que é acusado de usar, para fins estritamente pessoais, recursos que deveriam ser destinados à concessão de crédito através da Crediquali. O pastor tentou ‘derrubar’ a ação, mas o repasse de R$ 11 milhões pelo Governo do Estado à entidade frustrou a tentativa.
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa rejeitou a alegação de inadequação do processo levantada pelas defesas de Wilton Acosta, seu filho Lucas Rael Alves Acosta, e a ex-diretora financeira Arlei Melo Acosta Coleone. Para se livrar da denúncia, o trio argumentou que a Crediquali tinha autonomia financeira e não recebeu recursos públicos, por isso, não deveria responder por improbidade.
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No entanto, o titular da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande relatou que a instituição foi sucessora do Banco do Povo/Banco Cidadão, criado pela Lei Estadual n.º 1.977/1999 com o objetivo de facilitar a criação, o crescimento e a consolidação de empreendimentos de pequeno porte, formais ou informais, associativos ou individuais, mediante a concessão de microcrédito a juros abaixo do mercado em associação com o Governo de Mato Grosso do Sul.
A lei previu a abertura de crédito especial no orçamento do Governo do Estado a título de auxílio financeiro à entidade no valor de R$ 11,181 milhões.
“Desse modo, ainda que a CREDQUALI gozasse de autonomia financeira (tanto para auto-sustentação como para a composição do respectivo fundo financeiro), não se pode olvidar que houve o repasse de valores pelo estado de Mato Grosso do Sul ao menos a título de custeio, criação e auxílio financeiro (subvenção) no importe de R$ 11.181.760,99, enquadrando-se a CREDQUALI na hipótese prevista no artigo 1º, parágrafo único (§§ 6º e 7º), da Lei n.º 8.429/1992 (com a redação dada pela Lei n.º 14.230/2021)”, explicou o juiz Ariovaldo Corrêa.
O magistrado deixou para analisar as alegações de inexistência ou insuficiência de provas e de ausência de elemento subjetivo para a configuração de ato de improbidade quando julgar o mérito do processo em sua sentença.
“Cumpre esclarecer que, como destacado linhas atrás, os fatos narrados na inicial indicam de maneira clara e suficiente a prática de condutas dolosas pelo requerido capazes de, em tese, configurarem ato de improbidade administrativa, o que justifica o prosseguimento do feito, pois somente caberia a extinção desta ação com fundamento na inexistência de ato de improbidade administrativa quando a mesma é manifesta, o que não é o caso”, fundamentou o juiz em decisão do dia 4 de junho.
A ação de improbidade administrativa tem como réus o Wilton Acosta, na função de diretor-presidente da Funtrab e conselheiro da Crediquali, que contou com o auxílio de outros integrantes da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), entre os quais o também conselheiro e seu filho, Lucas Rael Alves Acosta; e o diretor-geral Rosinildo Aparecido de Oliveira e a diretora financeira Arlei Melo Acosta Coleone.
Os quatro são acusados de se apropriarem indevidamente de bens ou valores pertencentes à Crediquali, que foi constituído a partir de acervo, inclusive patrimonial, da Instituição Microcrédito Banco Cidadão de Mato Grosso do Sul (“Banco Cidadão”), vinculada à Fundação de Trabalho.
Fórum Evangélico, compra de carro e estúdio
O Ministério Público Estadual aponta que Wilton Acosta desviou a quantia de R$ 9.032,30 pertencente à Crediquali para custear despesas privadas relacionadas ao evento promovido pelo Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política (FENASP), na época presidido pelo ex-candidato a deputado federal. O evento tem cunho eminentemente religioso e político, sem relação com os fins sociais da instituição de microcrédito.
O MPE apurou que, entre janeiro de 2017 a agosto de 2018, o então presidente da Funtrab utilizou em proveito próprio e para atender interesses particulares um Hyundai Tucson pertencente à Crediquali. Embora o veículo tenha sido adquirido para atender as necessidades da instituição, passou a ser utilizado exclusivamente pelo pastor para o exercício de atividades de cunho privado, inclusive permanecendo estacionado na residência dele.
Lucas Rael Acosta é acusado de desviar R$ 5.789 da instituição para compra de um GM Astra, ano 2009, para uso próprio. O então conselheiro também utilizou sala comercial localizada no Centro de Campo Grande alugada em nome da Crediquali para instalar uma empresa, desviando também os valores correspondentes à montagem do estúdio de música, tudo com anuência e a comando de Wilton Melo Acosta.
O Ministério Público Estadual cobra o ressarcimento de R$ 19.623,59 por parte de Wilton Acosta; R$ 7.603,40 de Lucas Acosta; R$ 7.603,40 de Rosinildo de Oliveira; e R$ 12.020,19 de Arlei Acosta Corleone; além de multa civil e suspensão dos direitos políticos. O MPE também requer R$ 196.235,90 em danos morais coletivos.
A defesa de Wilton Melo Acosta, Lucas Alves Rael Acosta e Arlei Melo Acosta Coleone defendem que a Crediquali não pode ser enquadrada na Lei de Improbidade Administrativa, já que em momento algum recebeu recursos públicos para sua formação. E também negam ter cometido os desvios.
Os réus apontam que a lei estadual 1977/901 prevê e autoriza auxílio financeiro advindo do Governo do Estado no limite de R$ 900 mil, e destacaram que o aporte inicial feito pelo poder público estadual nunca se constituiu como aporte patrimonial, mas sim auxílio financeiro.