O vereador Carlos Augusto Borges, o Carlão (PSB), recorreu ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul para não devolver um trator, avaliado em R$ 220 mil, a um casal de produtores rurais de Camapuã que caiu no golpe do OLX. O parlamentar foi condenado a devolver o maquinário porque pagou metade do valor de mercado, R$ 120 mil.
Conforme a ação judicial, Beatriz Alves de Lima Lara Calvis e Jeferson Lara Calvis, de Camapuã, anunciaram a venda do trator New Holland 7630, ano 2016, por R$ 220 mil, no Facebook e no OLX. Adão Aparecido Guimarães de Freitas mostrou interesse no negócio e topou pagar o valor anunciado.
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O casal tomou o cuidado de checar o comprovante de pagamento com um funcionário do Bradesco. Os dois primeiros tinham erro evidente e não foram aceitos. Somente o 3º, quando o vereador foi até a propriedade rural para pegar o trator, foi considerado verdadeiro pelo banco e Jeferson Calvis liberou o trator para Carlão. Ele até teria funcionado e colocado em cima do caminhão.
Na versão de Carlão, ele comprou o trator de Adão, que se apresentou como cunhado do produtor rural, pelo valor de R$ 120 mil. Ao verificar pessoalmente o trator, o socialista efetuou o restante do pagamento, R$ 40 mil, para o golpista.
Quando o casal descobriu que o dinheiro não tinha caído na conta, tentou reaver o trator, mas Carlão não aceitou devolvê-lo. O caso foi parar na Justiça. O juiz Ronaldo Gonçalves Onofri, da 2ª Vara Cível e Criminal de Camapuã, julgou o pedido procedente e mandou Carlão devolver o trator ou pagar R$ 220 mil às vítimas do golpe.
Vereador não provou transfereência
“Contudo, esse suposto pagamento feito pelo terceiro fraudador (Adão), constante do documento de f. 201, jamais entrou na conta bancária do autor, isto é, o autor Jeferson não recebeu o pagamento do trator e o comprador/requerido Carlos efetuou o pagamento ao estelionatário (Adão) de R$ 120.000,00”, pontou o magistrado.
Para condenar o vereador, o juiz apontou que ele efetuou o depósito para outra pessoa, Anderson Augusto de Freitas, foi negligente porque não exigiu comprovante da titularidade do trator, não havia foto do vendedor no WhatsApp e a conversa tinha erros grosseiros de português.
“Nesse contexto, não é crível que o requerido não desconfiou do golpe que estava sendo perpetrado pelo falsário. E mais, o requerido foi por duas vezes na fazenda e não falou e nem questionou detalhes sobre o trator ou sobre a compra e venda com o autor Jeferson”, pontuou Onofri.
“Ora, se tivesse perguntado ou falado apenas o preço do negócio já evitaria o golpe do falsário, mas quedou-se inerte”, destacou.
Outro ponto é que o ex-presidente da Câmara de Campo Grande não apresentou à Justiça o comprovante do pagamento de R$ 120 mil nem disponibilizou extrato bancário. “Por outro lado, se é certo que estamos tratando de comprovante de pagamento falso enviado pelo estelionatário Adão ao autor/alienante, no valor de R$220.000,00 (f. 201), o requerido deveria, além de ter apresentado o comprovante de transferência de f. 200, ter trazido cópia de seu extrato bancário, comprovando que, efetivamente, o valor saiu de sua conta bancária, todavia, novamente, não o fez”, destacou o magistrado.
Defesa diz que Carlão também foi vítima
“O estelionatário, se passando como comprador, negociava a aquisição do trator com o autor Jeferson pelo preço de R$ 220.000,00 e, se passando como proprietário, negociava a venda do trator para o requerido por um preço inferior (R$130.000,00 ou R$ 120.000,00) ao pretendido pelo verdadeiro proprietário (autor)”, relatou a defesa de Carlão.
“Ademais, após a ciência do golpe, em momento algum se cogitou da inexistência de contrato entre as partes Beatriz, Calves e Carlos, restando devidamente esclarecido que uma quadrilha especializada em golpes na página eletrônica da OLX conseguiu enganar os postulantes, que agiram de modo incauto e descuidado, propiciando que estelionatários se fizessem passar como seus prepostos junto ao demandado CARLOS”, apontou o advogado.
“Indisputável, pois, que a presunção de boa-fé do corréu Carlos não restou ilidida e que as partes, alienante e adquirente, foram vítimas do golpe orquestrado por estelionatário”, afirmou.
“Destarte, comprovado o pagamento pelo réu Carlos e exercida a sua posse justa, destituída de violência, clandestinidade ou precariedade, desde o mês de abril do ano de 2021, portanto há quase 4 (quatro) anos, merece reforma a sentença que imputou-lhe os prejuízos da inobservância de cuidado dos autores, devendo ser reconhecida a total improcedência das pretensões iniciais por descumprimento da comprovação dos fatos constitutivos do direito alegado; não versando o caso sobre responsabilidade concorrente das partes, mas sim sobre culpa exclusiva dos vendedores, conforme fartamente delineado na peça recursal e escorado nos inúmeros precedentes citados acima e que se amoldam ao caso telado”, peticionou.
O relator do recurso é o desembargador João Maria Lós e será analisado pela 1ª Câmara Cível do TJMS. O tribunal já foi favorável ao vereador ao suspender liminar que tinha determinado a devolução do trator ao casal.