O Superior Tribunal de Justiça anulou as provas baseadas nos relatórios de inteligência financeira obtidos diretamente pela Polícia Federal junto ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) na Operação Sordidum. Diante da decisão, a 5ª Vara Federal de Campo Grande declarou a nulidade de “absolutamente todos” os elementos da investigação da PF que mirou grupo suspeito de movimentar dezenas de milhões do tráfico.
De acordo com o juiz Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini, a solicitação dos relatórios do Coaf constou logo no início da investigação e as informações obtidas foram determinantes e nortearam a condução do inquérito da PF. “A ilegalidade contaminou todas as diligências e provas subsequentes”, definiu o magistrado.
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O processo se encaminhava para a designação das audiências de instrução e julgamento, após a 5ª Vara Federal aceitar a denúncia e tornar réus 16 investigados por organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Segundo o Ministério Público Federal, o grupo criminoso atuava há quase uma década em um esquema para lavar dinheiro proveniente do tráfico de drogas, de operações ilegais de câmbio e de outras ilegalidades.
A quadrilha operava em diversos estados brasileiros, especialmente no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Bahia e Paraná, e mantinha contato com doleiros do Paraguai e com traficantes de países da América Central, como Guatemala e Honduras.
De acordo com o MPF, a Operação Sordidum faz conexão com outras operações análogas, como a Prime e a Downfall, que investigam outras organizações criminosas cujos integrantes, em dado momento, operaram juntos em suas empreitadas criminosas ou fizeram “negócios” entre si.
A defesa dos réus recorreu ao Superior Tribunal de Justiça alegando que as provas obtidas pela PF nos relatórios do Coaf eram ilegais, pois deveriam ter sido autorizadas pela 3ª Vara Federal de Campo Grande, juízo responsável pela fase de investigação. A Corte Superior deferiu o habeas corpus e mandou a 5ª Vara Federal analisar a validade das demais provas.
“Nessa toada, é consequência inarredável a declaração de nulidade de ABSOLUTAMENTE TODOS os elementos indiciários obtidos desde a instauração do IPL 2020.0028815-SR/PF/MS, pois à exceção das informações de polícia judiciária iniciais, relativas a diligências de campo, a solicitação dos relatórios de inteligência financeira constou logo da portaria instauradora do inquérito policial e, em função de que seu conhecimento foi determinante e norteou a condução do inquérito policial, a ilegalidade contaminou todas as diligências e provas subsequentes”, decidiu Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini.
“Os indícios apontando o envolvimento dos demais investigados, inclusive RONILDO CHAVES RODRIGUES e outros diretamente vinculados a ele, surgiram exatamente a partir da análise dos relatórios de inteligência financeira encaminhados pelo COAF a pedido da autoridade policial, e disso não há dúvida, como se vê do parágrafo 7 da denúncia, segundo o qual “a partir da análise das contas bancárias mantidas por CELSO LUIS, chegou-se ao denunciado RONILDO RODRIGUES, que utilizava identidade falsa em nome de ROBSON ALVES RODRIGUES”, relata o magistrado.
“As representações pelo afastamento dos sigilos bancário e fiscal (autos n. 5003558-14.2020.4.03.6000) e telemático (autos n. 5003557-29.2020.4.03.6000) foram igualmente sustentadas nas informações compartilhadas pelo COAF, tal como as respectivas decisões que os autorizou, até porque a grandiosidade do suposto grupo criminoso não era inicialmente conhecida. Aliás, denotando a inexistência de outros meios de se chegar aos demais denunciados, ALEXANDER SOUZA, tampouco pessoas ligadas a ele, nem sequer foi alvo dessas medidas inaugurais, haja vista seu elo com RONILDO ter sido descortinado por meio da quebra do sigilo telemático de outros investigados.”
“Portanto, forçoso reconhecer que os relatórios de inteligência financeira não apenas orientaram, mas constituíram verdadeira linha de vida comum a toda a investigação, cujas diligências posteriores, dadas as informações que se tem nos autos, não seriam justificáveis e logicamente alcançáveis por outro meio, e, por conseguinte, todas hão de ser declaradas nulas, derivadas que foram de provas consideradas ilícitas”, concluiu.
Conforme a decisão publicada no Diário de Justiça Eletrônico Nacional de 7 de julho, graças a anulação das provas, foram relaxadas as prisões preventivas de Alexander Souza, Celso Luís de Oliveira e Ronildo Chaves Rodrigues, além da revogação dos mandados de prisão dos suspeitos que estavam foragidos e devolução dos bens apreendidos, esta última medida apenas após o trânsito em julgado do HC no STJ.
Todos deixam de ser réus, já que o recebimento da denúncia também é anulado, e como o processo retorna à fase de investigação, os autos foram devolvidos para a 3ª Vara Federal.