Diante do “aumento exponencial” da violência contra profissionais da saúde, o Sinte/PMCG (Sindicato dos Trabalhadores Públicos em Enfermagem do município de Campo Grande) criou uma ferramenta para que os servidores da categoria possam registrar casos sofridos durante o trabalho. A medida foi tomada devido ao alto índice de subnotificação, já que mais de 86% das vítimas não registram a ocorrência à polícia.
O Agressômetro foi lançado durante audiência pública na Câmara Municipal de Campo Grande, nesta segunda-feira (14). Com o tema: “Violência no Ambiente de Trabalho – Plano de Ação”, o debate teve como foco principal propor medidas para enfrentar a violência contra servidores da rede municipal de saúde da Capital.
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Conforme Leandro Dias, presidente Coren (Conselho Regional de Enfermagem), a subnotificação é uma realidade, no entanto, pesquisa realizada pela entidade apontam que 41,2% dos profissionais responderam que já sofreram violência psicológica, inclusive ameaça de morte no Estado. O segundo índice é de violência física, com 26,9%. Na sequência vem assédio sexual, 20,4% , e assédio moral 11,5%.
O quadro de profissionais da Enfermagem é formado por 83,1% de mulheres. Leandro Dias informa que 86,4% das vítimas não fazem denúncia. Além disso, 79,7% dos trabalhadores que sofrem violência não se afastam do serviço, para não deixar a população desassistida e sobrecarregar os colegas.
De acordo com o presidente Coren, as agressões são praticadas em sua esmagadora maioria pelos próprios usuários dos postos de saúde; 55,4% são pacientes e 18,8%, acompanhantes.
O presidente do Sinte/PMCG, Angelo Macedo, anunciou que o Agressômetro já está disponível e pode ser acessado no site oficial do sindicato no endereço: https://sintepmcg.org.br/.
“Estamos entregando hoje ao profissional de enfermagem uma ferramenta que vai permitir que muitos desses casos que são subnotificados, a gente possa hoje encontrar maneiras de rastreá-los e ter condições de saber com clareza quantos são e onde estão os índices de maior violência sofrida pelo profissional de enfermagem”, discursou Angelo.
Macedo explicou que os dados serão mantidos em sigilo e que será possível verificar se a notificação foi realmente feita por um profissional da enfermagem. Ele também esclareceu que a ferramenta não deve substituir o registro de boletim de ocorrência por parte das vítimas.
A psicóloga Eveli de Vasconcelos, doutora em Psicologia da Saúde e coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Processos Psicossociais e Saúde, relatou que o alto índice de subnotificação à polícia é consequência da necessidade da vítima informar seu endereço no boletim de ocorrência, o que gera medo de uma retaliação pelo agressor. Ela também propôs medidas para coibir a violência.
“Uma solução é criar um plano de ação, uma sistemática, que é uma série de ações relacionadas a diversos âmbitos da sociedade que podem auxiliar nesse processo, que vai desde a elaboração de política pública a políticas internas nas organizações, nos postos, com treinamento e desenvolvimento da liderança das pessoas. Acima de tudo é preciso uma mudança de cultura, que está em todos os ambientes de trabalho, não só nos postos de saúde”, reforçou.
O secretário adjunto de Saúde de Campo Grande, Aldecir Dutra de Araújo, destacou que o número de usuários do sistema público de saúde aumentou muito, devido à alta dos preços dos planos de saúde. “Temos bairros em Campo Grande, que a cada 10 habitantes, 10 usam a nossa unidade para tratar da saúde. Isso é em toda Campo Grande”, afirmou.
Aldecir Araújo acredita que o aumento da violência contra os profissionais têm relação com a pandemia de Covid-19. “Depois da pandemia, as pessoas estão mais intolerantes e sem paciência”, declarou. O ajunto da Saúde também elencou as medidas tomadas para evitar os casos de violência.
“Temos feito barreiras físicas entre os servidores e os usuários, na farmácia, na recepção, onde é possível fazer essa contenção, com vidro, com balcão mais humanizado, para melhorar essa conversa. O que nós criamos no final do ano passado foi a Ronda da Saúde, que faz parte de um plano municipal de segurança. Essa ronda tem por região, as rondas da GCM e avançamos muito em tempo resposta”, relatou.
“Criou-se grupos de Whatsapp por base sanitária, linkados com a base da GCM, onde esse grupo tem acesso ao comandante dessa base, para acionar essa central e o tempo de resposta é de 5 a 7 minutos, isso tem tido um bom andamento. Mas queremos criar essa Ronda da Saúde, para que a viatura caracterizada dentro do território possa ficar passando ali para dar mais segurança para o servidor trabalhar”, informou Aldecir.
Na Tribuna, a presidente do SASEMS (Sindicato dos Assistentes Sociais do Estado de Mato Grosso do Sul), Monica Ilis, afirmou “é com profundo pesar que venho manifestar minha insatisfação e repúdio pela violência sofrida pelos assistentes sociais nas unidades de saúde. Não podemos mais tolerar que profissionais que dedicam sua vida ao serviço da população sejam vítimas de ameaças, agressões e desrespeito. A violência contra servidores públicos não é somente um ataque a indivíduos, é um ataque à própria instituição do Estado. É um atentado à democracia e à ordem social. O assistente social é um profissional fundamental para garantir acesso igualitário aos serviços de saúde, principalmente a grupos vulneráveis. É inadmissível que esses profissionais sejam vítimas de violência e desrespeito. É inadmissível que sejam tratados com tanta hostilidade. Isso não é um fato isolado, mas um sintoma de uma sociedade doente, onde a falta de respeito e a violência imperam. É preciso que nós servidores e cidadãos nos unamos para mudar essa cultura”.
O coordenador do Conselho Municipal de Saúde, Jader Vasconcelos, salientou que “a gente enxerga isso com bastante preocupação como Conselho e a gente, inclusive, enxerga a preocupação maior pela inércia do Poder Público em relação a isso. A gente não vê nenhum tipo de atitude do Poder Público, quer seja um plano de segurança nas unidades pra combater esse tipo de atitude. A gente vê há anos a violência contra o trabalhador da saúde só aumentar e eu não vejo como conselheiro, nenhum tipo de atitude da gestão pra combater esse essa violência. É importante trazer esse assunto à tona, que possamos sair dessa audiência com um plano de ação. Com certeza pro trabalhador é bastante vantajoso, a gente enxerga com bons olhos”, afirmou.
Segundo o superintendente do Comando da Guarda Civil Metropolitana, Anderson Ortigoza, “já apresentamos algumas sugestões que foram acatadas, como preparar os servidores para gerenciar crises no ambiente de saúde. Se tiver um profissional ali para identificar esse potencial agressor e tentar resolver a questão antes que evolua. Está andamento um curso para 120 gestores e administrativos. Qualquer tipo de violência não é mais cabido nos dias de hoje, seja de médicos, assistentes sociais, enfermeiros, todos merecem respeito de todo mundo, da população, da gestão. Todo mundo pede a Guarda fixa nessas unidades, mas temos 90 unidades, sendo nove 24 horas, nessas nove já temos guarda 24 horas. Eu não consigo prometer ter guarda 24 horas em todas as unidades, porque tem outras secretarias para atender, além das demandas que as viaturas atendem diariamente”, explicou.