Audiência pública na Câmara Municipal de Campo Grande sobre a violência contra profissionais da saúde levantou que um dos problemas enfrentados pelos servidores é a fiscalização por vereadores em postos para se promover nas redes sociais. Na legislatura passada, o caso mais emblemático na Capital foi do então parlamentar Tiago Vargas (PP), que acabou não conseguindo se reeleger, e atualmente Isa Marcondes (Republicanos) utiliza o mesmo expediente em Dourados.
O debate realizado, na segunda-feira (14), contou com representantes de sindicatos de categorias de servidores da saúde, da prefeitura, trabalhadores e da segurança. Dados apresentados pelo presidente do Coren (Conselho Regional de Enfermagem), Leandro Dias, apontam que as agressões são cometidas majoritariamente por pacientes (55,4%) e seus acompanhantes (18,8%), e que 70% dos servidores já sofreram algum tipo de violência.
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Com “índices alarmantes” e “aumento exponencial” de casos, o Sinte/PMCG (Sindicato dos Trabalhadores Públicos em Enfermagem de Campo Grande) criou até um Agressômetro para que os servidores registrem quando forem vítimas de agressões físicas ou alguma forma de assédio.
A preocupação com a atuação de vereadores em postos de saúde com gravações de vídeo e seu possível impacto no aumento da violência foi levantada pelo advogado Márcio Almeida, que representa o Sinte/PMCG.
Márcio afirma que a fiscalização tem o intuito de “criar sensacionalismo e colocar a população contra os trabalhadores de saúde”. “Como se a culpa de ter uma oferta menor e uma demanda muito maior fosse dos trabalhadores de saúde”, alegou o advogado durante discurso na tribuna da Câmara da Capital.
Ele lembrou que acompanhou uma enfermeira à delegacia de polícia após ela discutir com o então vereador Tiago Vargas na UPA Universitário. A profissional processou o parlamentar por calúnia, mas a 11ª Vara do Juizado Especial Central rejeitou a ação com base na imunidade parlamentar.
Almeida sugeriu que a Câmara Municipal de Campo Grande crie uma resolução para proibir a atuação isolada de vereadores em unidades de saúde. “Nós precisamos que a Câmara não seja só local de debate, mas também de ações”, pediu.
“Isso está acontecendo novamente aqui em Mato Grosso do Sul e a Capital precisa dar exemplo. Porque em Dourados nós temos uma vereadora que também está com a mesma conduta. Inclusive o sindicato dos médicos é autor de ação judicial em relação a essa vereadora”, relatou o advogado sem citar o nome de Isa Marcondes.
“Precisamos da aprovação de resolução aqui na Câmara vetando essa prática. Para que o vereador não seja um artífice desta promoção da violência. Porque quando ele vai na unidade e expõe o trabalhador, ele acaba colocando o trabalhador como responsável pela mazela sofrida por ele [usuário]”, defendeu Márcio Almeida.
O conselheiro do Coren Wilson Brum também demonstrou preocupação com a atitude da parlamentar douradense. “As redes sociais vieram para nos ajudar, mas também nos atrapalha muito. Lá em Dourados, infelizmente, estão incitando a população contra os trabalhadores da saúde. Isso não dá para aceitar. A gente precisa evitar que isso aconteça”, declarou.
Ação judicial do sindicato dos médicos
O SindMedMS (Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul) recorreu à Justiça para barrar as fiscalizações realizadas nas unidades de saúde pela vereadora Isa Marcondes (Republicanos), conhecida como “dona de zona” em Dourados. Também pede a remoção de todos os vídeos postados nas redes sociais da parlamentar douradense. Como não expõe os nomes nem imagens dos profissionais, a assessoria informou que a medida é tentativa de “censura”.
No início deste mês de julho, Isa Marcondes e o médico da unidade básica de saúde do Distrito de Indápolis foram parar na Polícia Civil. Ele exigiu retratação da parlamentar e proferiu insultos contra Isa Marcondes. “Dona de zona fala que é vereadora”, debochou.
A parlamentar acusou o médico Luís Ricardo de Melo Rodrigues Borges, 40, de desacato. Ele registrou queixa contra a parlamentar bolsonarista por calúnia. A briga repercutiu nas redes sociais de ambos. Outro médico chegou a pedir a cassação do mandato de Isa Marcondes, mas o pedido foi negado pela Câmara Municipal de Dourados.
O sindicato dos médicos destacou que a ação não é um ato isolado em Dourados e vem sendo propagada em várias cidades brasileiras. O caso chamou a atenção do CFM (Conselho Federal de Medicina).