Adolescente ficou internada 21 dias e moto segue sem conserto. (Foto: Arquivo Pessoal)
A assistente administrativo Jéssika Gonçalves Valente Ferreira, 37 anos, levava sua filha Kamille, 15, à escola pela Rua Padre João Crippa como rotineiramente fazia todos os dias, quando a vida de ambas sofreu um abalo ao cruzar a Rua Barão do Melgaço. Era manhã de segunda-feira, 2 de junho deste ano. Ela não lembra que carro as atingiu, testemunhas dizem ter sido um Volkswagen Gol preto que desrespeitou o sinal de “PARE” e colidiu com a Honda Biz em que elas estavam.
Imediatamente após o acidente, a informação era de que mãe e filha estavam com ferimentos leves e foram encaminhadas a um hospital. Entretanto, a situação de Kamille era mais grave do que se pensava. Ela teve de passar por cirurgias, foram 21 dias internada no Proncor, onde passou pela retirada de um rim.
A moto parcialmente destruída rendeu um prejuízo de R$ 6 mil e a família agora tem esperança de achar o motorista que fugiu, para conseguir recuperar a Honda Biz, já que agora não podem contar com cobertura do seguro DPVAT.
O antigo Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito garantia cobertura em casos de morte, invalidez permanente e despesas médicas e hospitalares, este último até R$ 2.700,00 por vítima. Os valores eram atualizados conforme o salário mínimo, utilizado como referência para teto de cobertura.
Até 2020, o DPVAT era cobrado junto ao licenciamento e administrado por um consórcio privado. Em 2021, a cobrança foi suspensa e o fundo com os recursos remanescentes chegou ao fim em novembro de 2023, levando à suspensão da solicitação de pagamento de indenizações para acidentes após esse período.
Nos anos seguintes, foi debatido um novo modelo de seguro obrigatório (o SPVAT) que mudaria a cobertura e a gestão. Em dezembro de 2024, a lei complementar que criava o SPVAT foi revogada com apoio unânime da bancada federal de Mato Grosso do Sul.
Os deputados federais bolsonaristas Dr. Luiz Ovando (PP), Marcos Pollon e Rodolfo Nogueira, ambos do PL; Dagoberto Nogueira e Geraldo Resende, do PSDB, além de Camila Jara e Vander Loubet, do PT, votaram pela revogação do seguro obrigatório para motoristas. Beto Pereira (PSDB) não participou dessa votação, em dezembro do ano passado.
Motorista fugiu
De acordo com Jéssica Ferreira, o motorista que teria causado o acidente pedia perdão a todo momento e dizia que seu filho estava em choque dentro do carro, mas desapareceu quando o socorro chegou. A farmacêutica Anelize Garafa prestou assistência às vítimas.
“Meus pais chegaram, eu e minha filha estávamos sendo atendidas na ambulância. Foi nesse momento que começaram a procurar o motorista causador do acidente e viram que havia ido embora”, conta Jéssica. “Por isso, ninguém ali que estava por perto, até onde sabemos, conseguiu pegar informações, infelizmente”.
No hospital, uma nova agonia começou. Kamille foi diagnosticada com uma lesão grave em um dos rins. Depois de dias de complicações, o órgão teve de ser retirado em cirurgia no domingo, 8 de junho. A adolescente permaneceu na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) até o dia 11.
Novas complicações surgiram e foram necessários mais procedimentos, como transfusões de sangue, na jovem de 15 anos.
“Com todos os cuidados, conhecemos tantos médicos. Todos deram a atenção no caso da Kamille, impressionados por ela ser jovem e estar passando todo aquele sofrimento, eles ficaram em cima dela, pra salvar a vida dela”, diz a mãe. Os profissionais conseguiram atingir o objetivo e, no dia 22 de junho, a adolescente teve alta.
Preocupados com a filha internada, Jéssica Ferreira e o marido não “tiveram cabeça” para localizar o responsável por causar todo aquele sofrimento.
“Por irresponsabilidade dele, minha filha perdeu um rim e correu todo o risco de vida, durante 21 dias no Hospital Proncor. Negligência de uma pessoa que nos pediu perdão o tempo todo, mas foi embora sem deixar contato com alguém caso fosse preciso”, afirma Jéssica.
Depois da agonia no hospital, com a filha ainda em recuperação em casa, a família agora foca no prejuízo financeiro. A moto segue no mesmo estado de destruição, sendo necessário cerca de R$ 6 mil para o reparo. Nenhuma câmera registrou o acidente. A Polícia de Trânsito não atendeu a ocorrência. E o DPVAT não existe mais.
O que resta é a esperança de que o motorista que fugiu seja encontrado e assuma as despesas. “Então seria para consciência do rapaz que causou o acidente e sim para assumir a despesa. A moto está parada em uma oficina. Uso para trabalhar”, relata Jéssica.
A procura pelo causador do acidente é um tiro no escuro, já que ninguém anotou a placa do carro que teria desrespeitado o sinal de “PARE” e a única informação é de que ele dirigia um Volkswagen Gol preto. Diante disso, a família lamenta a extinção do seguro DPVAT.
“Nesse momento, com a experiência que tive, conseguimos ver o quanto precisamos do seguro, o quanto é importante. Ainda mais para quem não tem condições, no momento igual eu, de poder arcar com os custos, prejuízos, bem difícil”, lamenta Jéssica.