A Justiça estadual rejeitou o processo movido pelo presidente da Cassems (Caixa de Assistência dos Servidores do Estado de Mato Grosso do Sul), Ricardo Ayache, contra um policial militar por ter sido comparado ao presidente da Venezuela, o ditador Nicolás Maduro. O juiz responsável pelo caso decidiu que não houve crime e as críticas estão cobertas pela liberdade de expressão.
A queixa de Ayache contra o presidente da Abecams (Associação dos Beneficiários da CASSEMS do Mato Grosso do Sul), Jeder Fabiano da Silva Bruno, apontou os crimes de calúnia (imputar a alguém fato definido como crime) e difamação (imputar a alguém fato ofensivo à sua reputação) em comentários postados nas redes sociais.
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Numa das postagens, Jeder afirma que “a atual presidência tomou a CASSEMS para si como Maduro tomou a Venezuela”. Posteriormente, postou que “existe a necessidade de uma devassa nas contas da CASSEMS”, “por instituição policial ou mesmo ministério público”, pois, ao seu ver, haveria “desvio de dinheiro, enriquecimento ilícito” na instituição.
Noutro post, questiona a criação do banco da instituição. De acordo com a defesa, o policial tece comentários no sentido de que a Cassem “carrega muita mentira ao longo dos anos”, que “verdades surgirão” e que o banco teria sido criado para obter “lucros em cima da CASSEMS”.
A ação penal movida por Ayache destaca que o presidente da Cassems não ignora que a liberdade de expressão é direito fundamental, previsto na Constituição Federal, mas alega que o policial extrapolou essa prerrogativa.
Para o juiz Deyvis Ecco, da 2ª Vara Criminal de Campo Grande, porém, as críticas estão dentro do limite da liberdade de expressão.
“Da análise dos comentários proferidos pelo querelado, acima descritos, não se visualiza o animus caluniandi ou animus diffamandi, elementos subjetivos do tipo, consistentes na vontade livre e consciente de macular a honra objetiva de terceiro”, argumenta o magistrado. “Ao revés, verifica-se que os comentários proferidos pelo querelado encontram-se dentro do âmbito da liberdade de expressão, direito fundamental constitucionalmente consagrado”.
O juiz Deyvis Ecco acrescenta que Ricardo Ayache é uma figura pública e que o policial militar é servidor estadual, portanto, tem interesse na condução do primeiro frente à Cassems.
“Neste viés, ainda que se considere que as críticas tecidas pelo querelado possam, de certa forma, incomodar o querelante, deve-se, no caso, entender pela relativização dos seus direitos à honra e imagem, consoante teoria da proteção débil do homem público”, diz o magistrado.
“É cediço que o cidadão que opta por gerir a coisa pública se expõe e tem sua vida privada, intimidade e imagem naturalmente mitigados frente à liberdade de informação e suas prerrogativas inerentes de opinar e criticar, deixando-lhe mais suscetível às críticas, observação e controle da população.”
“Sendo assim, analisando os comentários tecidos pelo querelado, conclui-se que sua intenção não era ofender a honra objetiva do querelante (não havia dolo específico), mas sim expor seu descontentamento, ainda que em forma de duras críticas, quanto às ações e situação financeira da CASSEMS, limitando-se à atuação do querelante enquanto presidente da entidade. Na verdade, tais comentários não exorbitaram do campo da livre manifestação do pensamento, garantia constitucional, e, dessa maneira, são incapazes de ensejar responsabilização criminal”, conclui o juiz.
A queixa-crime foi rejeitada em sentença publicada no Diário de Justiça de 4 de setembro.
Médico cardiologista, Ricardo Ayache cumpre o 4º mandato consecutivo no comando da Cassems e recorreu da sentença.