O desembargador Amaury da Silva Kuklinski, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, concedeu liminar e a prefeita Adriane Lopes (PP) poderá cobrar multas aplicadas a cerca de 320 mil motoristas por radares e lombadas eletrônicas, apesar da empresa não ter nenhum vínculo com a prefeitura. O contrato venceu no dia 5 de setembro do ano passado e as infrações foram registradas, apesar da falta de respaldo legal.
Por outro lado, o magistrado negou o pedido para manter o pagamento de R$ 5,092 milhões, por meio de confissão de dívida, ao Consórcio Cidade Morena. Pela nova “modalidade” adotada por Adriane, o município não realizou licitação a tempo nem renovou o contrato emergencialmente, mas manteve os equipamentos eletrônicos em operação e aplicando multas normalmente.
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Apesar de parecer surreal, o desembargador considerou que as multas não podem ser anuladas. “Assiste razão ao Agravante quanto a validade das multas de trânsito por infrações ocorridas, uma vez que enquanto ato administrativo sancionatório, depende unicamente da ocorrência da infração e da regularidade do auto de infração, conforme o artigo 280 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), não sendo influenciada pela existência ou vigência de um contrato administrativo”, destacou Kuklinski.
Autor da ação popular, o vereador Marquinhos Trad (PDT) acreditava piamente que a Justiça não validaria multas aplicadas por uma empresa sem contrato com o poder público. “Não pode, não tem contrato”, garantia o ex-prefeito.
Surpreso com a decisão, ele antecipou que irá apelar da decisão na defesa dos condutores. “Marquinhos Trad informa que irá recorrer, na defesa dos superiores interesses do povo local”, informou, em nota à imprensa.
Surreal e inacreditável
A aplicação das multas e a cobrança por falta de contrato foi suspensa pelo juiz Flávio Renato Almeida Reys, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. Ele destacou que a prefeita não tinha base legal para manter a cobrança e as multas deveriam ser anuladas porque o contrato com o Consórcio Cidade Morena, responsável pelos equipamentos eletrônicos, venceu e não foi aditivado nem renovado.
O recurso da Agetran foi distribuído para o desembargador Odemilson Roberto Castro Fassa, que alegou suspeição por “motivo de foro íntimo” e o agravo foi distribuído ao desembargador Paulo Alberto de Oliveira. Ele também declinou, também por foro íntimo, mas explicou que tinha multas de trânsito e optou por não comprometer a isenção do judiciário para analisar o caso.
Kuklinski assumiu o processo e deu razão à Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito). “Isso significa que o ato de multar é independente de outros contratos, como os que poderiam ser firmados para a operação de trânsito, focando-se nos requisitos legais para sua validade, desde que o laudo de aferição dos equipamentos pelo INMETRO não esteja vencido no período das ocorrências”, afirmou o desembargador.
Para se ter ideia do rigor da legislação de trânsito, até a decisão da Justiça estadual, a Polícia Militar ou Guarda Municipal só pode aplicar multa de trânsito mediante convênio. Não basta o policial militar ter noção de trânsito. Apenas os policiais habilitados e credenciados oficialmente podem registrar as infrações de trânsito.
TCE apurar dívida após contrato
Por outro lado, o desembargador determinou que o Tribunal de Contas do Estado seja notificado sobre a confissão de dívida feita por Adriane para analisar a legalidade do pagamento dos R$ 5,092 milhões. “Todavia, em relação à suspensão temporária do pagamento do reconhecimento de dívida deve ser por ora, até o julgamento do recurso pelo colegiado, mantido”, pontuou.
“Considerando que contratos administrativos devem ser fiscalizados pelo Tribunal de Contas, com maior razão os Reconhecimentos de Dívida após o término do contrato administrativo, devem ter sido também analisados, de modo que nada impede que essa parte da decisão seja melhor analisada ao menos até o julgamento”, explicou Kuklinski.
“Ante o exposto, concede-se parcial efeito suspensivo ao presente recurso, para suspender a decisão agravada na parte em que determinou a cessação da aplicação de penalidades decorrentes dos aparelhos de fiscalização, e de cobrar multas eventualmente aplicadas, considerando enquanto atos administrativos sancionatórios, dependem unicamente da ocorrência da infração e da regularidade do auto de infração, conforme o artigo 280 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), não sendo influenciada pela existência ou vigência de um contrato administrativo”, determinou.
A decisão livra a prefeita de devolver R$ 33 milhões em multas aos motoristas de Campo Grande.