Em mais uma etapa da maratona para impedir que ações de improbidade administrativa prescrevam, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa proferiu mais duas sentenças relativas ao Aquário do Pantanal, atualmente chamado de Bioparque.
Em uma, o titular da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos absolveu os réus acusados de improbidade administrativa pela morte de milhares de peixes do Aquário do Pantanal e fraude em licitação. Na outra, foi julgado parcialmente procedente pedido para restituição de parte de recursos de projeto de biodiversidade para o Bioparque devido a irregularidades.
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A primeira sentença trata da denúncia do Ministério Público Estadual de ter havido “conluio” para a contratação irregular da Anambi Ambiental, responsável por cuidar dos peixes que viriam a fazer parte do Aquário do Pantanal. A empresa é acusada de ter deixado mais de seis mil morrerem.
Conforme a acusação, o ex-diretor-presidente do Imasul e ex-secretário estadual do Meio Ambiente, Carlos Alberto Negreiros Said Menezes, teria pactuado com João Onofre Pereira Pinto e Marcelo Augusto Santos Turine, ex-reitor da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), a contratação da Anambi mediante dispensa de licitação.
O intuito seria burlar processo licitatório e facilitar a contratação de pessoas físicas e jurídicas por meio de convênio firmado com a Anambi, beneficiando terceiros em detrimento ao erário. Para tanto, teria havido direcionamento na chamada pública que culminou no Termo de Outorga nº 143/2013 e posterior subcontratação de José Sabino.
O processo foi desmembrado em relação a Marcelo Turine graças a recurso concedido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. De certa forma, azar o dele, porque o titular da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos decidiu absolver todos os réus. E o desfecho em relação ao ex-reitor da UFMS vai ficar para depois.
O MPE pediu a condenação dos requeridos Anambi – Análise Ambiental, Carlos Alberto Negreiros Said de Menezes,Geraldo Augusto da Silva, João Onofre Pereira Pinto, José Sabino e Thiago Farias Duarte pela prática dos atos de improbidade administrativa , além do ressarcimento ao estado de Mato Grosso no Sul dos prejuízos causados de R$ 2.086.620,97.
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, por sua vez, julgou que a denúncia não se sustenta por falta de provas.
“Pois bem. No que de refere à dispensa de licitação irregular, não se sustenta. Com efeito e de acordo com a prova colhida nos autos, bem como durante a fase de inquérito, restou claro que a quarentena dos peixes destinados à população do Aquário do Pantanal foi desenvolvida como um projeto de pesquisa e extensão destinado para além da simples contratação de serviços ou do turismo, abrangendo também a área científica ede biodiversidade, enquadrando-se, portanto, na hipótese prevista Lei n.º10.973/2004 (Lei de Inovação), a qual previa, com a redação vigente na época da Chamada FUNDECT/IMASUL n,º 21/2014 – Biodiversidade-MS”, afirmou.
“Como se vê da legislação aplicável ao caso, em se tratando de projeto de pesquisa e extensão celebrado com propósito além do efetivamente aquisitório, ou seja, cujo objeto extrapola a mera realização de obra ou a simples compra de insumos destinados à administração pública, e considerando a matéria envolvida no desenvolvimento da atividade, a qual é reconhecidamente inovadora por se tratar o Aquário do Pantanal do maior circuito de água doce do mundo, não se aplicam as regras tradicionais do processo licitatório previstas na Lei n.º 8.666/1993, vigente na época,enquadrando-se a Chamada FUNDECT/IMASUL n.º 21/2014 –Biodiversidade-MS na exceção prevista no artigo 24, XXXI, da referida lei,autorizando a dispensa da licitação”, fundamentou.
“Assim, considerando não se tratar de contratação de obra,serviço ou de compra realizada pela administração pública, mas sim de projeto de pesquisa e extensão inovador visando a coleta da população de plantas e animais destinados ao maior aquário de água doce do mundo,aplicável o regramento próprio em detrimento da regra geral de licitação,inexistindo ilegalidade ou irregularidade nesse ponto”, arrematou.
Também não prosperou a alegação do MPE de que houve cerceamento indevido da competição em razão de exigir a participação de empresas com fins lucrativos e sediadas em Mato Grosso do Sul.
Isso porque “restou reconhecida a possibilidade legal de abertura de processo seletivo simplificado ou similar e consequente celebração de termo de outorga da instituição vencedora com amparo na Lei n.º 10.973/2004, sendo que a Chamada FUNDECT/IMASUL n.º 21/2014 – Biodiversidade-MS convidou as empresas que atuem na área ambiental no Estado de Mato Grosso do Sul a apresentarem propostas para obtenção de financiamento destinado à execução de projeto de pesquisa e extensão no âmbito do PROGRAMA BIOTA-MSe PROGRAMA AQUÁRIO DO PANTANAL, em conformidade com as disposições desta Chamada Pública, do Termo de Cooperação Mútua FUNDECT e IMASUL nº001/2014, processo nº 23/100.966/2014 e com simetrias à Chamada FUNDECT/SEMAC/SEPROTUR/FUNDEMS nº 19/2013 – INOVA-MS”.
“As cláusulas apontadas pelo requerente não se revelam como limitadoras e muito menos são suficientes a demonstrar um direcionamento, por parte dos requeridos servidores públicos, à empresa Anambi – Análise Ambiental e/ou seus sócios”, explica o magistrado.
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa também definiu que, da prova colhida, não é possível concluir que os requeridos Carlos Alberto Negreiros Said Menezes e João Onofre Pereira Pinto tenham atuado, colaborado ou participado, de maneira consciente e voluntária, na contratação da empresa Anambi – Análise Ambiental e de Thiago Farias Duarte cientes de que não possuíam capacidade técnica para a execução do projeto de pesquisa e extensão voltado à captura, quarentena e manejo dos espécimes destinados a povoarem o Aquário do Pantanal.
Devolução de verba à Fundect
A sentença que absolveu os réus foi publicada no Diário de Justiça Eletrônico de sexta-feira, 10 de outubro. Na mesma edição, foi dado publicidade à condenação da Anambi – Análise Ambiental e Thiago Farias Duarte a restituírem parte dos valores glosados à Fundect, relativos ao projeto simplificado intitulado “Biodiversidade Para Todos:da Água à População da Ciência e Proteção da Vida por Meio do Aquário do Pantanal”.
A referida chamada pública convidou empresas que atuassem na área ambiental deste Estado para apresentarem propostas para obtenção de financiamento destinado à execução de projeto de pesquisa e extensão no âmbito do Programa Biota-MS e Programa Aquário do Pantanal.
Thiago Farias Duarte aderiu ao chamamento na qualidade de coordenador técnico, ou seja, aquele que deve ter competência técnica e experiência profissional relacionada ao tema da proposta e participar diretamente na execução das atividades programadas na proposta.
A Anambi – Análise Ambiental aderiu ao edital na qualidade de empresa beneficiária e coexecutora do projeto de pesquisa.O projeto simplificado apresentado por eles foi selecionado e recebeu o auxílio financeiro de R$ 5,109 milhões.
O Ministério Público Estadual denunciou que foram realizadas três avaliações técnico científicas do projeto por equipe de consultores da Fundect, nas quais se verificou a existência de divergências na execução, além de atraso na 2ª prestação de contas pelos requeridos, sendo que, em razão disso, houve a rescisão do projeto de pesquisa em 30 de junho de 2015.
Com a rescisão do contrato, foi apresentada prestação de contas final pelo outorgado, na qual se constataram inconsistências e irregularidades. Após o devido processamento, ficou constatado que o valor original a ser devolvido ao erário se refere aos recursos outorgados e glosados em R$ 1.570.693,87, bem como que a esta quantia deve ser acrescido o valor de R$ 302.661,90 referente à contrapartida que deveria ter sido apresentada pelos outorgados, tendo em conta que eles não fizeram a comprovação do aporte neste valor, totalizando R$1.873.693,77.
O Ministério Público Estadual pediu a condenação dos réus aos pagamento de R$ 2.374.749,63 como restituição aos cofres públicos.
Em sua sentença, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa informou que algumas das irregularidades apontadas ou foram sanadas pelos acusados ou não se justificam.
“Desse modo, devem ser excluídos da glosa os valores apontados nos itens 2.1.1.1, 2.1.1.2, 3.1.1, 5.3.1, 7.1.4, 7.2.1, 7.2.9 e 7.2.10, bem como retificado o que consta no item 8 para a importância de R$ 67.398,90, mantidos os demais, que devem ser restituídos pelos requeridos à requerente”, decidiu o magistrado. O valor total a ser ressarcido, que deve ser atualizado com juros e correção monetária, não consta na sentença.
O MPE pode recorrer de ambas as sentenças.