Dois advogados colocaram sob suspeita a venda de uma praça por R$ 2,8 milhões pela prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP). A progressista é acusada de alienar, na surdina, a área de lazer dos moradores do Bairro Itamaracá sem autorização da Câmara Municipal e sem leilão, como determina a nova Lei de Licitações. E o mais grave, o valor da área estaria subfaturado.
Alexandre Afonso de Araújo e Rogério Pereira dos Santos pedem liminar para suspender o negócio e, no mérito, a anulação da negociação de Adriane. A área de 8.809 metros quadrados era classificada como área verde e deveria ser equipada como uma praça para ser usada como lazer pelos moradores.
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O caso é mais um imbróglio que pode se transformar em escândalo na gestão da prefeita da Capital. A Prefeitura chegou lançar o edital para levar a área a leilão por R$ 2,4 milhões. No entanto, no ano passado, Adriane desistiu do certame e prometeu, era campanha pela reeleição, manter a praça na Avenida Guaicurus.
Para surpresa dos moradores e da sociedade, na surdina, a prefeita vendeu a área por R$ 2,809 milhões para a Agropecuária 3Ab. A empresa está no nome de Adilson Batista da Silva, Adriano Batista da Silva e Andreia Batista da Silva. Fundada em 13 de janeiro de 2021, ela seria proprietária de três fazendas em Porto Murtinho.
“Em ato de investigação defensiva, regulamentada pelo Provimento 188/2018 da OAB, os Autores confirmaram a transmissão irregular do bem público, através da emissão da certidão atualizada da matrícula de inteiro teor do imóvel, bem como pela cópia da escritura de venda e compra, ambas acostadas em anexo”, destacaram os advogados.
Negócio ilegal e sem autorização dos vereadores
“Ocorre que a alienação de bem público sem o devido processo licitatório e a prévia autorização legislativa, afronta os princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, devendo, portanto, ser declarada nula de pleno direito”, alegaram Araújo e Santos.
“Ressaltam que a Avenida João Lemos de Rezende possui atualmente a nomenclatura de Avenida Guaicurus, sendo uma das vias mais importantes da cidade de Campo Grande/MS, em franca expansão comercial. O valor da venda se mostra inferior ao praticado pelo mercado em áreas similares na mesma via, o que denota ainda mais prejuízo ao erário”, alertaram.
“A ilegalidade da alienação de área pública é latente, e serão expostos a seguir todos os requisitos que não foram adotados pelos Réus, levando ao cabimento do presente remédio constitucional para anular o ato lesivo ao patrimônio público”, pediram.
“Ocorre que a mesma área havia sido negociada em venda direta, sem licitação, em julho de 2024 por R$ 2,4 milhões, sendo divulgada à época pela mídia local. No entanto, diante do escândalo, a administração municipal desistiu da venda um mês depois e chegou a anunciar melhorias, como quadra de areia, academia ao ar livre e revitalização do espaço”, relembram, citando matérias de jornais na época.
Só que na época, Adriane, que é evangélica e se gaba de ser missionária da Assembleia de Deus Missões, não cumpriu a promessa e vendeu a área sem realizar o leilão, como determina a legislação federal.
“Assim, para renegociar o imóvel público, a prefeitura municipal deveria republicar o edital sob os preceitos da Lei nº 14.133/2021, não podendo revalidar o edital original datado do ano de 2023, mesmo porque, a área somente foi negociada em julho desse corrente ano”, pontuaram.
“A venda de um bem público, prevista nos termos do Código Civil e da Lei nº14.133/2021, que trata das licitações e contratos administrativos, exige desafetação, avaliação prévia, licitação e, no caso de bens imóveis, expressa autorização legislativa”, frisaram.
“Caixa preta”
Os advogados denunciaram que o negócio se transformou em uma “caixa preta”, um mistério a ser desvendado. “Não há até o presente momento qualquer informação disponível no site da Prefeitura Municipal de Campo Grande, a respeito do processo licitatório que alienou a área pública, o que se mostra como mais uma irregularidade, colocando todo o processo licitatório sob ainda mais suspeição”, alertaram.
“Tampouco se encontra qualquer informação relativa ao aludido edital e ao processo administrativo no DIOGRANDE, que é o Diário oficial do Município, sob endereço https://diogrande.campogrande.ms.gov.br/. A prefeitura é obrigada a realizar licitações e divulgar os processos em sítios eletrônicos oficiais, conforme determina a Lei nº 14.133/2021 que centraliza e torna obrigatória a publicação de todos os atos relacionados às contratações públicas”, repisaram, sobre as regras da civilidade que não estariam sendo respeitadas na Capital de Mato Grosso do Sul.
“Assim, diante da ausência de autorização legislativa para transmissão da área pública, da ausência do devido processo legal e da desafetação irregular de bem público de uso comum do povo, o ato administrativo deve ser anulado”, solicitaram.
“Evidente que estes atos narrados acima constituem improbidade administrativa, por força dos artigos 10 e 11, da Lei 8.429/92, por ter a ação ou omissão em tela dado ensejo à lesão patrimonial, desvio, apropriação e dilapidação de bens públicos, além de atentado contra os princípios da administração pública e violação dos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade”, reforçaram.
“Diante da gravidade dos fatos e do risco de consolidação de negócio jurídico nulo, requerem a concessão de medida liminar, nos termos do art. 5º, §4º, da Lei nº 4.717/65, para suspender imediatamente os efeitos da alienação do imóvel público matriculado sob nº 122.406na 1ª Circunscrição de Campo Grande/MS, retornando ao status a quo, determinando, ainda, que os requeridos se abstenham de praticar construção ou alteração física da posse sobre o referido bem, até o julgamento final da presente ação”, pediram.
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, determinou que a prefeita se manifeste em 72 horas. Somente após ouvir o outro lado, o magistrado decidirá sobre o pedido de liminar.
O caso é curioso porque um escândalo parecido marcou a campanha eleitoral de 2024. Adriane Lopes foi acusada de construir a mansão sobre uma praça no Bairro Carandá Bosque. Ela alegou que comprou a área por meio de alienação pública.