Sufocadas pelo Garras (Delegacia de Repressão a Roubo a Banco, Assaltos e Sequestros), as cabines dos apontadores do jogo do bicho desapareceram da cena urbana de Campo Grande, mas a jogatina resiste na base da “omertà”. Nome da operação que há 525 dias combate organização criminosa e acumula sete fases, omertà é um voto de silêncio. E agora a jogatina também ganha essa face. Sai o jogo livre, entra a intermediação dos velhos conhecidos.
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Sem as cabines, o jogo presencial se dá por meio de apostadores veteranos que tem o contato dos apontadores. A aposta é impressa em papel e o resultado chega no celular, no aplicativo WhatsApp. Alguns correm no Rio de Janeiro, como o “corujinha” na terça à noite. Outros, pela loteria federal, como nas manhãs de quarta-feira. Resultados também podem ser conferidos baixando aplicativo.
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A ofensiva contra as 400 cabines do jogo do bicho, até então espalhadas por toda a cidade, ganhou as ruas em setembro do ano passado, quando o Garras realizou a operação Black Cat (gato preto). A Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano) também passou a coibir as barraquinhas instaladas nas calçadas.
O jogo do bicho surgiu no Brasil há mais de 120 anos, com a criação de banco de apostas para evitar que o zoológico do Rio de Janeiro fechasse. Já em 1941 passou a ser proibido pela lei como jogo de azar e considerado contravenção.
Em Campo Grande é conhecido desde sempre e até ganha menção especial em relatórios do SNI (Serviço Nacional de Informação) datado 1981. Um dos pilares do sistema repressivo da ditadura, o serviço de espionagem destacou que na década de 1980 a jogatina imperava. Não só na modalidade jogo do bicho, mas também em cassinos espalhados por mansões de endinheirados, no que se convencionou chamar de alta sociedade.
O documento do SNI traz um circuito da jogatina, com cassino e\ou bancas do jogo do bicho. Na Rua Dom Aquino, um policial foi apontado como responsável por imóvel que abrigava jogos de azar. Na mesma via, foram citados outros dois endereços. Segundo o relatório, a jogatina também acontecia na Barão do Rio Branco e na Calógeras. Era apontada a conivência de autoridades de seguranças. Ou seja, foram 40 anos sem repressão substantiva ao jogo do bicho.
A modalidade também divide opiniões. Há quem veja na prática só mais uma oportunidade de tentar a sorte, enquanto organismos de investigação alertam que o jogo do bicho financia organizações criminosas e perigosas.
A operação aponta os empresários Jamil Name e Jamil Name Filho como líderes de organização responsável por crimes de pistolagem, trafico de armas e corrupção em Mato Grosso do Sul. Um dos braços financeiros é o jogo do bicho.
Omertà em fases – A operação liderada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e Garras saiu às ruas pela primeira vez em 27 de setembro de 2019. As investigações sobre a morte por engano de um universitário, filho de policial militar, levaram Name, 81 anos, e o filho para a prisão. Nessa primeira onda ainda foram presos policiais civis, guardas municipais e um policial federal.
A segunda fase foi deflagrada em 17 de março de 2020 contra plano de matar promotor do Gaeco e delegado do Garras. A terceira etapa não tardou. Em 18 de junho, a Omertà 3, fase Armagedom, foi à Ponta Porã para prender o Rei da Fronteira, como é conhecido Fahd Jamil, e o filho Flávio Correia Jamil Georges. Os processos correm, mas os dois seguem foragidos. De acordo com a investigação, as organizações eram próximas e se apoiavam mutuamente.
A quarta fase foi a Black Cat, realizada em 23 de setembro do ano passado. A Omertà 5 veio em 7 de outubro. Batizada de Snowball, a ação investigou crimes de agiotagem, com dívidas que viravam “bola de neve”.
Na sequência, em 2 de dezembro, foi a vez da etapa Arca de Noé, que resultou no fechamento do Pantanal Cap e atacou as gerência do jogo do bicho.
