Sem realizar audiência de instrução e julgamento, o juiz Márcio Alexandre Wust, da 6ª Vara Criminal de Campo Grande, inocentou o ex-prefeito Gilmar Antunes Olarte (sem partido), a gerente do Banco Safra e um golpista da acusação de dar um golpe de R$ 800 mil em um casal evangélico. O Ministério Público Estadual recorreu contra a sentença, mas o magistrado negou o recurso e manteve a absolvição.
Conforme a denúncia, Olarte conheceu o casal quando era pastor na Assembleia de Deus Nova Aliança. Afastado da prefeitura e condenado por corrupção, ele indicou ao casal um suposto leilão de um prédio na Avenida Marechal Deodoro, no Jardim Tijuca.
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Para viabilizar o negócio, ele apresentou Diego Aparecido Francisco, acusado por aplicar vários golpes na Capital e no interior, como advogado imobiliário para viabilizar o negócio. Ele intermediou o encontro do casal com Alessandra Carrilho de Araújo, gerente do Banco Safra, que viabilizou o empréstimo de R$ 350 mil para “comprar” o prédio.
Só que não existiu leilão, o casal de comerciantes ficou sem o prédio e sem o dinheiro. O MPE denunciou os três por associação criminosa e estelionato. O juiz aceitou a denúncia e o trio virou réu pelos dois crimes.
A sentença
No dia 21 de abril deste ano, Wust prolatou a sentença e absolveu Olarte, Alessandra e Diego dos crimes de estelionato e associação criminosa. Ele pontou que não houve prova de que os três aplicaram golpe no casal, porque o negócio estava em nome da filha e não teriam provado as acusações.
“As declarações da vítima para que produzam efeitos jurídicos probantes devem ser corroboradas por outras provas produzidas (CPP, art. 201 – é o que o Código chama de ‘… as provas que possa indicar…’)”, ponderou o magistrado.
“O princípio probante é que as declarações de toda pessoa que possui interesse no processo (acusado, vítima e informantes) é suspeita de parcialidade e não-credibilidade, e, para que produzam efeitos jurídicos probantes deve ser corroborada por prova que a lei não-presuma suspeita de parcialidade e não-credibilidade (perícia, documentos e testemunhas)”, explicou-se Wust.
“Em suma, a lei não-presume a veracidade das declarações das vítimas (ao contrário das testemunhas). Outra interpretação não é possível. O ordenamento jurídico presume que o acusado não-praticou a conduta delitiva que lhe é imputada”, destacou.
“De outro lado, a prova documental (instrumentos de contrato – mandato, conta corrente e empréstimo; registros bancários; recibos de pagamento) não foi produzida (CPP, art. 6º, I, II, III c/c art. 158, 167). Logo, o acusado não-pode ser condenado com fundamento nas declarações acima referidas, posto que viola as normas de direito probante (CPP, art. 157, in fine, e §1º)”, concluiu o juiz.
Sem julgamento
O promotor Élcio D’Angelo ingressou com embargos de declaração contra a absolvição dos três réus. Ele apontou que o juiz não realizou audiência de instrução e julgamento, apesar de ter informado na sentença ter feito o procedimento.
“Sabe-se que os fatos existem, sendo que, somente uma sentença de mérito exauriente, com análise aprofundada das provas e realização de audiência de instrução e julgamento será capaz de chegar a tal conclusão. À fl. 472, a r. Sentença pontuou que houve audiência de instrução e julgamento e que as partes ofereceram alegações finais, entretanto, conforme se observa nos autos, tais atos não foram realizados no presente processo judicial”, alertou o promotor.
“Por outro, não foi esgotada a produção de provas nos autos, por exemplo, porque não houve a realização de audiência de instrução no processo. Os fundamentos do ‘julgamento antecipado’ do processo acarretaram evidente prejuízo à persecução penal, sendo necessário sanar a obscuridade e contradição que permeia a r. Sentença para tornar clara a decisão do Estado Juiz”, apelou D’Angelo.
“Portanto, considerando que a decisão proferida no limiar do processo demonstra-se incompatível com a sumariedade prevista no artigo 397, do CPP, e que há erros materiais causados pela obscuridade e contradições existentes no r. Sentença, é necessário que sejam sanados tais vícios, viabilizando eventual análise sobre o interesse recursal por parte do Ministério Público”, pontou.
O magistrado negou os pedidos e manteve a absolvição dos acusados. Ele frisou que Olarte, Alessandra e Diego Francisco negaram os fatos. O MPE pode apelar da sentença ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.