A juíza May Melke Amaral Penteado Siravegna, da 4ª Vara Criminal de Campo Grande, condenou sete a 44 anos e dois meses de cadeia pelo roubo da propina do corretor de gado José Ricardo Guitti Guímaro, o Polaco, ocorrido há quase oito anos. Entre os condenados está o sargento da Polícia Militar Hilarino Silva Ferreira, o Lino, primo do ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), o despachante David Cloky Hoffmam Chita, e o pedreiro Luiz Carlos Vareiro, o Véio.
O processo tramita em sigilo e é um dos mais rumorosos da política estadual. Conforme a denúncia dos promotores Clóvis Amauri Smaniotto e Marcos Alex Vera de Oliveira, o grupo foi contratado pelo advogado Rodrigo Souza e Silva, filho do ex-governador, para roubar R$ 300 mil, suposta propina destinada a comprar o silêncio de Polaco, que ameaçava fazer delação premiada logo após a delação premiada dos donos da JBS.
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O roubo ocorreu na BR-262, entre Campo Grande e Terenos no dia 27 de novembro de 2017. O grupo cercou o carro do comerciante Ademir José Catafesta, que pegou o dinheiro no estacionamento do Supermercado Comper da Rua Joaquim Murtinho, no Centro, e roubo os R$ 300 mil.
O escândalo veio a tona com a prisão do grupo pelo Batalhão de Choque no dia 6 de dezembro daquele ano. Inicialmente, Ademir disse que só tinham roubado o carro e levado R$ 9 mil. A verdade só ocorreu após a prisão de todos os integrantes do grupo.
Rodrigo Souza e Silva foi denunciado como mandante do roubo, mas foi absolvido por falta de provas pela juíza May Melke Siravegna. A magistrada chegou a rejeitar a denúncia contra o filho do ex-governador, mas a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul acatou pedido do MPE, concluiu que havia provas e determinou o julgamento do herdeiro tucano. Ele foi absolvido com aval do promotor Fábio Goldfinger, que substituiu Marcos Alex na 30ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público.
O roubo da propina
No entanto, os envolvidos diretamente no roubo não foram perdoados pela magistrada. Conforme despacho publicado nesta terça-feira (2), May Melke condenou Hilarino Silva Ferreira a seis anos no regime semiaberto. Ele é apontado como o responsável pela contratação do grupo para roubar a propina.
O despachante David Chita foi condenado a seis anos por ter intermediado a contratação entre Lino e o Véio. Ele está com a prisão preventiva decretada no escândalo de desvio do Detran e segue foragido. Na campanha eleitoral do ano passado, ele apareceu para acusar o deputado federal Beto Pereira (PSDB) de chefiar o esquema, mas não apresentou provas e teve o pedido de delação premiada rejeitado pelo MPE.
O líder do grupo, Luiz Carlos Vareiro, também foi condenado a seis anos no semiaberto. Semianalfabeto, ele aparece como laranja de uma empresa denunciada por desvios em obras da Prefeitura de Campo Grande. O autônomo Vinicius dos Santos Kreff foi condenado a seis anos no semiaberto.
Menos sorte tiveram Jefferson Braga de Souza, o Neguinho, e Fábio Auguto de Andrade Monteiro, que foram condenados a seis anos e nove meses no regime fechado. Jozué Rodrigues das Neves, o Cezar Cantor, também pegou a mesma pena, de seis anos e nove meses, mas no semiaberto. Todos os réus não terão direito a substituição da pena.
Quebra de sigilo e provas
A expectativa do grupo era de que Polaco fosse receber a propina. No entanto, ele pediu para um amigo, o comerciante Ademir José Catafesta encontrar Lino no estacionamento do Supermercado Comper da Rua Joaquim Murtinho. O empresário aquidauanense confirmou o encontro e o pedido de Polaco.
Esta versão, conforme os promotores, foi confirmada com a quebra do sigilo telefônico. No dia do encontro, Catafesta ligou três vezes para o primo do governador, que entregou os R$ 300 mil, e duas vezes para Polaco, o beneficiário do dinheiro.
Rastreamento dos telefones celulares e imagens das câmeras de segurança indicam que Hilarino Silva Ferreira saiu da empresa e no carro da Trucadão, que pertence a Rodrigo Souza e Silva, e se encontrou com Catafesta no supermercado. O dinheiro foi transportado no porta-malas dos veículos.
No dia do roubo da propina, Vareiro ligou três vezes para David Chita, que teria repassado o local da entrega da propina e o itinerário de Catafesta. O MPE identificou 22 ligações entre os telefones de ambos.
Os promotores destacam que Cézar Cantor fez 312 ligações para Kreff, responsável pela interceptação de Ademir Catafesta na BR-262. O rastreamento dos celulares confirma que o quinteto estava em Terenos na tarde do crime.
O MPE confirmou 18 ligações de Lino para Polaco entre os 19 de outubro e 29 de novembro de 2017, período em que teria ocorrido a negociação para pagar a propina. Dos R$ 300 mil roubados, os acusados de participar do assalto ficaram com R$ 70 mil, enquanto Vareiro ficou com o restante para entregar ao primo e ao filho do ex-governador do Estado, segundo o MPE.
Na época da denúncia, o advogado de Polaco, José Roberto Rodrigues da Rosa, negou que seu cliente tenha recebido propina para não fazer delação premiada.
O advogado de defesa de Rodrigo, Gustavo Passarelli, destacou que não há provas contra o seu cliente. Rodrigo acabou absolvido pela Justiça. Reinaldo Azambuja classificou a denúncia contra o filho de “covardia”.
O advogado Márcio Sandim afirmou que o Hilarino Silva Ferrreira é inocente e não há provas de que participou do roubo da propina de Polaco. Ele vai analisar a sentença para apelar contra a condenação.
Os réus poderão recorrer da sentença.